top of page

 Texto 8 

A arte da composição de Ernst Haas

“Colour is joy!” (Cor é alegria, vida!) Conhecido como fotógrafo comercial e fotojornalista, Ernst Haas criou uma obra única e mágica. Nascido na Áustria em 1921, filho de pai judeu, foi obrigado a abandonar a faculdade de medicina em 1940 e se profissionalizou como fotógrafo ao final da Segunda Guerra Mundial.


Fotos de prisioneiros de guerra que retornavam do "front" publicadas nas revistas “Heute” e “Time” projetaram-no para o mundo. Mais tarde, ele declararia: “Eu realmente nunca quis ser fotógrafo. Surgiu lentamente a partir do compromisso de um menino que desejava combinar dois objetivos – explorador e pintor. Que melhor profissão poderia haver do que a de fotógrafo, quase um pintor apressado, sobrecarregado por demasiadas impressões em constante mudança?” Haas teve uma sólida educação em arte e pintura na juventude.


Em 1949, ingressou na agência Magnum e mudou-se para Nova York em 1951, optando por documentar as ruas em cores ricas. Dizendo que teria sido “preguiçoso” em Viena, ele descreveu Nova Iorque como “a cidade que faz você trabalhar e tira tudo de você... uma verdadeira metrópole, um mundo dentro de um mundo.”

Uma lucrativa carreira na publicidade – incluindo as imagens icônicas do “cowboy” da Marlboro – permitiram a Haas a oportunidade de explorar a fotografia autoral. Ele usava a cor como elemento compositivo. Sua forma de revelar e imprimir (Dye-transfer, técnica responsável pela saturação das cores e intensos contrastes) aproximam-no da pintura impressionista. Haas não usava cor em imagens já pensadas ou compostas. A cor é um elemento constituinte da composição.


Em 1962, uma retrospectiva do seu trabalho tornou-se a primeira mostra individual de fotografia em cores no Museu de Arte Moderna de Nova Iorque. Haas já era aclamado como pioneiro da fotografia artística em cores, junto com Saul Leiter e William Eggleston. 


As fotografias selecionadas são analisadas com o uso do “círculo cromático do artista” (Figura 1) que contém quatro, ao invés de três, cores primárias: amarelo, azul, verde e vermelho.

Figura 1.jpg

Figura 1 – Círculo cromático do artista

Ernst Haas é um mestre em compor com cores complementares ou análogas. Consegue, por vezes, inserir dois pares de complementares em uma única foto.


A fotografia nº 1 (“Route 66”) de 1969 é uma das mais famosas de seu acervo e apresenta um desafio para classificar seu estilo: “street”, abstrato ou crônica visual? Haas explora as cores complementares como ninguém. Nessa foto, aparecem os pares amarelo-azul e verde-vermelho distribuídos equilibradamente.

Fotografia 1.jpg

Fotografia nº 1 - “Route 66” de 1969

A Fotografia nº 2 explora cores análogas em torno do matiz vermelho e apresenta uma complementaridade na posição dos corpos das crianças, cujo dinamismo é reforçado pelas diagonais das gangorras.

Fotografia nº 2 – Nova Iorque, 1952

Complementaridade e contrastes também é tema da Fotografia nº 3. Todos os elementos apontam para a complementaridade, para o contraste e para o dinamismo: as cores, direção do olhar e as reações opostas das crianças.

Fotografia nº 3 “Simple things”

Um dos talentos de Haas é contar duas histórias dentro de uma mesma imagem. Ele consegue isso nesta fotografia nº 4 e usa o tronco da árvore no primeiro plano como elemento divisor dessas histórias. O recurso do “enquadramento” (ou “subframing”) pela parede da casa e pelos troncos à direita é usado com maestria. A forma da roda contrasta com a abundância de linhas verticais e horizontais, ao mesmo tempo em que "dialoga" com as curvas da estrada e com a forma curva do acabamento da varanda.

Fotografia nº 4 - “Puritan White”, 1960

Haas repete a técnica do “subframing” na Fotografia nº 5 e consegue contar “duas histórias” dentro de uma mesma imagem. O sutil par complementar verde-vermelho revela a assinatura. 

Fotografia nº 5 - Nova Iorque, 1970

Mais um exemplo do “subframing” proporcionado pela pintura no vidro e pela moldura da vitrine. Os dois pares de cores primárias complementares aparecem na Fotografia nº 6, embora o verde esteja “tímido” – mas ele está lá. Uma imagem que vale por uma aula completa.

Fotografia nº 6 - Nova Iorque, 1952 

A Fotografia nº 7 é a marca do impressionismo de Haas. O asfalto é forçado (talvez na pós produção) para a cor azul e compõe, com o amarelo, o par complementar de cores primárias que dominante. O carro vermelho é um “intruso” que confere dinamismo. Ele sabe que é um intruso e ensaia a sua saída em favor da harmonia.

Fotografia nº 7 – “Traffic”, 1963

A Fotografia nº 8 representa um duelo entre cores, tons e formas. O par complementar verde-vermelho disputa a atenção com partes amarelas e amareladas. Há um contraste interessante entre o homem iluminado pelo vapor ou neblina (contraluz) e a mulher de casaco claro que caminha em direção à esquerda. Haas renuncia a qualquer sentido de alinhamento do horizonte ou das verticais. Esquece tudo que não for cor, forma e luz. 

Fotografia nº 8 – Nova  Iorque,  1980

A  Fotografia nº 9 retoma o impressionismo e os pares complementares de cores primárias. O par amarelo-azul domina a cena, mas há regiões de vermelho-verde que “temperam” a foto. Haas parece nos dizer: “é simples, como nas primeiras aulas de pintura”! Mas, na verdade, é extremamente sofisticado. Van Gogh urbano?

Fotografia nº 9 – Nova Iorque “Motion Crosswalk II”, sem data

Não só de excesso vive o bom fotógrafo. O "Haas minimalista” aparece nesta Fotografia nº 10. Pouquíssimas cores, mas alguns pontos de atração e contraste (círculo x retângulos). A placa do carro “conversa” com o letreiro neon (cores análogas). As diagonais do carro quebram o ritmo das verticais do fundo. No lugar de cores, “não cores”: branco e preto dominam a imagem. O homem parece ser uma continuação do carro (e vice-versa). É para olhar, respirar e contemplar. 

Fotografia nº 10 – Nova Iorque, 1952

Haas explora os espelhos e vidros de Nova Iorque para compor suas abstrações. Uma cor. Objetividade hipnotizante? Sim, a Fotografia nº 11 irá fazer você questionar qual o motivo, o que é fundo, as orientações vertical e horizontal.

Fotografia nº 11 – Nova Iorque, 1980

Por fim, um resumo de tudo o que vi. Par verde-vermelho temperado por algumas análogas ao vermelho, abstração, controle técnico, composição, cor, energia... Está tudo aí na Fotografia nº 12. Incapaz de ficar impassível, devo concordar: “Colour is joy!”. Sua arte transborda energia e beleza.

Fotografia nº 12, “La Suerte de Varas” Pamplona, 1956

Fontes de imagens e de pesquisa:
https://ernst-haas.com
https://digitalphotograpycourses.co.za

bottom of page